No encontro em Kinshasa entre José Eduardo dos Santos e Kabila de segunda-feira passada (19.01.15), pelo que se pode inferir do conteúdo da nota do final das conversações, as duas partes manifestaram interesse em reforçar a cooperação entre os dois Estados nos domínios diplomático, económico e comercial.
Por António Setas
N o entanto, não se sabe ao certo se essas foram as reais razões do deslocamento de JES a Kinshasa.
A esse respeito, há quem pense que as razões invocadas apenas serviram de pára-vento a outros interesses, nomeadamente, tentar, após de um bom acerto de ideias, bem organizar e levar avante a revisão da constituição daquele país de modo a permitir a permanência de Joseph Kabila no poder.
Este último solicitara os bons ofícios de JES a fim de o informar sobre algumas subtilezas tácticas das artes e artifícios eticamente duvidosos, mas comprovadamente eficazes para permitir, não tenhamos medo de eufemismos, implementar e reforçar uma pujante e duradoura “estabilidade política” no Congo.
Mas foram infelizes os dois chefes, porque os partidos da oposição da RDC mobilizaram o povo. Realizaram uma grande manifestação de protesto o que obrigou José Eduardo dos Santos a fugir de Kinshasa a bordo de um helicóptero militar, enquanto a TPA, RNA e o JA informavam ao bom povo de Angola que o nosso camarada presidente tinha brilhado no Congo com todo o esplendor da sua ciência política. Brincadeira!
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O que por ora mais afecta a estabilidade do presidente Kabila são as FDLR, forças armadas constituídas por rebeldes hutus ruandeses que se refugiaram na RDC depois do genocídio contra os tutsis no Ruanda em 1994.
Muito irrequietas e eticamente inqualificáveis por serem desde o ano 2.000, um viveiro de actos qualificados de terroristas, as FDLR foram advertidas e alvo de ameaças de sanções, sendo a última delas um ultimato exarado pela Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), de que JES é actualmente presidente, no qual se indicava o mês de Dezembro de 2014 como tempo limite para a deposição das armas.
A desobediência a essa orientação implicaria uma acção militar para o desarmamento compulsivo. Ora o que acontece é que já passou de cerca de um mês o prazo estabelecido e, a julgar pelas movimentações diplomáticas do seu presidente, JES, ao que se junta a “visita” do presidente do Ruanda, Paul Kagame a Luanda, afigura-se um cenário que esgota todos os meios disponíveis para a resolução pacífica do endémico conflito ocasionado pela indisciplina das FDRL mas também pela impotência, de Kabila.
Da mesma fonte a que nos temos vindo a referir, os acordos de cooperação rubricados na segunda-feira passada, durante a visita de JES a Kinshasa, não passam de “periferia”, a constatação e análise in loco da situação militar no Congo foi o mote principal da sua deslocação enquanto responsável da CIRGL.
“O histórico deste processo remete-nos para um cenário em que só resta a voz de comando para premir o gatilho, a julgar pelos prazos já definidos para as ‘forças negativas’ deporem voluntariamente as armas. Estamos perante os últimos recursos diplomáticos para a solução da crise militar no Kivu Norte”, perspectiva a fonte.
Este assunto foi o verdadeiro motivo do encontro, anunciando sem anunciar uma muito próxima intervenção militar e policial na qual Angola teria a sua participação, uma vez que forças militares e de polícia já foram enviadas por Luanda para o Congo. No quadro, diga-se, das decisões da ONU.